É de espantar, o regime literário que esse simpático velhinho adotou em sua vida. Escreve todos os dias, antes de perambular anonimamente pela Curitiba imortalizada em suas obras. Novo ano, outra obra inédita. E sem dar sinais de diminuir o ritmo.
Diminuto, mesmo, é o texto. Conciso, enxuto, cheio de elipses. Reticências que traduzem uma vida. Contos de três páginas dão conta de uma assombrosa profundidade psicológica. Resenhistas bundões, zé ruelas preguiçosos, vivem dizendo por aí que é o mesmo, Dalton Trevisan. Que se repete. Que fala dos mesmos temas. Que está de novo, de volta. Queria ser Dalton Trevisan parar rir desses caras. Dalton não é mais o mesmo.
A Curitiba, onde residem os personagens do Vampirão, mudou. E ele não ficou parado no tempo. Suas obras mais recentes, como "Maníaco do Olho Verde" e "Violetas e Pavões", trazem personagens usando crack, arquivando fotos de menores nuas em notebook, relacionamentos de homossexuais.
Bem diferente das primeiras obras, "Cemitério de Elefantes" e "O Vampiro de Curitiba". "Curitiba não é mais a mesma", diz um personagem em "Nem Te Conto, João".
Mudou, também, a forma de escrever. Antes, Dalton Trevisan narrava bastante em terceira pessoa. De uns tempos para cá, os textos são narrados apenas em primeira pessoa. A mudança no foco narrativo está ligada diretamente à proposta literária do contista. Quando escreve sobre prostitutas, estupradores e traficantes, Dalton Trevisan mostra as perspectivas marginais, aproximando o leitor de seus anti-heróis.
Nunca reclamou, o Vampirão, de não ter vendido um milhão de livros. Disse a editora, recentemente, que vendeu cerca de 300 mil obras. Leitor fanático de Tchekov, aprendeu com o mestre russo a investir no pior do homem, arrancando gargalhadas do leitor com personagens pérfidos protagonizando cenas irascíveis. Grotesco é com ele mesmo.
Maníaco pela escrita, o Vampirão é nosso maior contista de todos os tempos. Não fosse brasileiro, dedicar-me-ia à língua portuguesa apenas para ler Dalton Trevisan no original.
Publicado no jornal O Diário, no dia 22 de maio.
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