segunda-feira, 4 de junho de 2012

Noel Gallagher faz show à la carte em São Paulo

Tentador, o convite. Ver Noel Gallagher, o principal compositor do Oasis, em seu show mais restrito no Brasil. Uma apresentação para poucos. Um esquema à la carte. Seria bem diferente das três turnês que o Oasis trouxe para cá. Não seria num estádio, como a do "Be Here Now". Nem seria para cerca de 14 mil pessoas, como foi na turnê do "Don’t Believe the Truth", ou para mais de 20 mil, como na "Dig Out Your Soul". Se lotasse, Noel Gallagher para apenas 8 mil.

Por isso, gente madrugando até no setor VIP. Todos queriam estar perto. Se possível, com os cotovelos fincados no palco. No gargarejo da bodega. Duas horas antes da abertura dos portões, fãs em filas no Espaço das Américas, em Sampa, controlando a ansiedade. De trilha, uma galera arranhando inglês e violão. Valia enrolar o idioma, arriscar uma segunda voz, com a boca gritar os solos de guitarra.
O que Noel Gallagher não ouviu, foi os fãs gritando seu nome na fila. Vez ou outra, alguém disparava "Liam Gallagher!" e, em seguida, caía na gargalhada. O nome de Caim, citado enquanto todos esperavam Abel, trazia uma amarga comparação. Noel fez um álbum solo primoroso, ganhou a crítica especializada e, nos shows, saiu retomando lados B do Oasis.

Liam, por sua vez, juntou os parceiros de banda e saiu tocando noutro projeto, abrindo mão das composições do Oasis - a maioria escrita pelo irmão. Agradou à crítica, mas o show não é lá essas coisas, sem boas baladas, sem o poder dos refrãos fraternos. Se deu melhor, o Noel.


O que Noel Gallagher não viu, foi na frente do palco, horas antes de dar os primeiros acordes. Bexigas amarelas sendo tacadas de lá para cá, com caricaturas dele a caneta, uma ou outra frase e, no meio das bexigas, uma escrita "Litle James" -para gargalhada dos fãs. A tal música marcou a estreia de Liam como compositor, escrita em homenagem ao filho dele e nunca chegou a entrar no repertório do Oasis.

Nos dois últimos shows de Noel e Liam em São Paulo, São Pedro não deu brecha. Fez um estrago. Era chuva como nunca dantes. Chuva para molhar a alma, carteira, R.G., cueca e meia. "O que acontece conosco e com a chuva em São Paulo?",desabafou Noel, durante a última apresentação. Com o tempo sisudo e nuvens carregadas, a chuva surgiu bem de leve, nem precisou de guarda-chuva, quase imperceptível, como se hesitasse. Mas isso Noel Gallagher não viu.

Vinte minutos antes, chegam no palco os papéis com o repertório. Cinco minutos depois, voltam para o camarim e retornam ao palco rasurados. O que havia ali, o que Noel deixou de tocar, a gente não viu. Tocaria, quem sabe, outro bom lado B sempre fora dos shows, como "Flashback", ou uma versão inusitada de "Garota de Ipanema"? Vai saber.

O que Noel Gallagher viu, foi um batalhão de fãs fiéis à sua espera. Gritando, pulando, cantando verso a verso. E não fez feio. Deu as caras sereno, um lord do rock. Foi bonito, emocionante demais, ouvir "Half the World Away", "Talk Tonight" e "Litle By Litle", lados B eternamente escanteados no repertório do Oasis. Funciona bem - e como! , o primeiro álbum solo executado praticamente na íntegra - só não rolou "Stop the Clocks". Da balada "If I Had a Gun" à inédita "Freaky Teeth", Sir. Noel Gallagher comprova que tem vida longa.

Mas são nos hits do Oasis que a casa cai. Cheios, os pulmões a todo vapor gritam "Don’t Look Back in Anger", "Supersonic" e "Whatever". Tiozões, adolescentes, casais abraçados. É o que conforta os fãs do Oasis. É o legado musical do Oasis que está ali, a oito pessoas na sua frente, executado sem estripulias, de forma competente: rock como o bom rock deve ser feito.

Nem mesmo a chuva, naquela quarta-feira, se arriscou a estragar a noite de Sir Noel Gallagher.

Publicado no jornal O Diário, em 7/5/2012.

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